**A Herança Além do Jordão**

Os filhos de Israel acamparam nas planícies de Moabe, às margens do rio Jordão, diante da terra prometida que mana leite e mel. O ar estava carregado de expectativa, pois após quarenta anos de jornada pelo deserto, finalmente estavam prestes a cruzar para Canaã. Mas, naquela noite, enquanto as fogueiras crepitavam e o murmúrio das famílias ecoava pelo acampamento, um grupo de homens se aproximou da tenda de Moisés.

Eram os líderes das tribos de Rúben e Gade, homens valentes que possuíam grandes rebanhos de ovelhas, bois e cabras. Com eles, vinham também alguns representantes da meia-tribo de Manassés, todos com um mesmo propósito. Prostrando-se diante de Moisés, do sacerdote Eleazar e dos príncipes da congregação, começaram a falar:

— Moisés, servo do Senhor, a terra que o Senhor conquistou diante do povo de Israel é uma terra boa para criação de gado, e nós, teus servos, temos muito gado. Se acharmos graça aos teus olhos, deixai-nos ficar nesta terra, do outro lado do Jordão, e não nos faças atravessar o rio.

Moisés, cujo rosto ainda brilhava com a glória do Senhor, ficou em silêncio por um momento. Seus olhos, marcados pelas décadas de liderança, fitaram os homens com intensidade. Então, sua voz ecoou, grave como o trovão no Sinai:

— Irmãos, vós ficareis aqui enquanto vossos irmãos vão à guerra? Porventura, fareis o coração dos filhos de Israel desanimar, como fizeram vossos pais quando espiaram a terra de Canaã? Eis que a ira do Senhor se acendeu naquele dia, e Ele jurou que nenhum daquela geração entraria na terra prometida, exceto Calebe e Josué. E agora, vós quereis repetir o pecado de vossos pais, acrescentando ainda mais à ira do Senhor contra Israel?

Os homens de Rúben, Gade e Manassés baixaram os rostos, sentindo o peso das palavras de Moisés. Mas um deles, chamado Elizur, ergueu-se e respondeu com determinação:

— Não é assim, nosso líder! Nós não abandonaremos nossos irmãos. Se for do teu agrado, construiremos currais para nosso gado e cidades para nossas crianças aqui, mas nós mesmos nos armaremos e marcharemos à frente dos filhos de Israel até que todos estejam estabelecidos em suas heranças. Não retornaremos às nossas casas até que cada tribo tenha recebido sua porção.

Moisés, aliviado, mas ainda cauteloso, inclinou a cabeça em sinal de aceitação.

— Se assim for, e se vós cumprires vossa palavra perante o Senhor, então esta terra será vossa possessão. Mas lembrai-vos: se falhardes, o pecado vos alcançará, e sereis culpados diante de Deus.

E assim, o acordo foi selado. Os homens de Rúben, Gade e a meia-tribo de Manassés construíram cidades fortificadas para suas famílias e currais para seus rebanhos na região de Gileade, uma terra fértil de pastagens verdejantes e colinas ondulantes. Mas, verdadeiros à sua palavra, todos os guerreiros dessas tribos se armaram e se uniram ao exército de Israel quando este cruzou o Jordão sob a liderança de Josué.

Por anos, eles lutaram ao lado de seus irmãos, desde as muralhas de Jericó até as planícies de Hazor. Somente quando a terra foi totalmente conquistada e repartida, eles receberam a bênção de Josué para retornar às suas famílias em Gileade.

Ao voltarem, construíram um grande altar às margens do Jordão, não para sacrifícios, mas como testemunho para as gerações futuras de que, embora habitassem do outro lado do rio, eram parte do povo de Israel e serviam ao mesmo Deus.

E assim, a herança além do Jordão tornou-se um lembrete de que a fidelidade e a unidade do povo de Deus são mais valiosas do que qualquer terra ou possessão. Pois o Senhor não olha apenas para as fronteiras geográficas, mas para o coração daqueles que O seguem com integridade.